BIOTECNOLOGIA
INTRODUÇÃO
A
Teoria da Evolução revolucionou o pensar da Biologia enquanto Ciência que
estuda os seres vivos – sua origem, sua morfologia, fisiologia e ecologia.
Charles Darwin, um naturalista por excelência, foi o pai de tal revolução,
afirmando que os seres vivos teriam evoluído de um ancestral comum, herdando
pequenas modificações, que se perpetuariam ou não, por seleção natural.
O
mecanismo da coevolução, a natureza do desequilíbrio de ligação ou a história
da diversidade das espécies pode atrair o interesse de poucas pessoas, mas o
tópico da evolução humana é de interesse praticamente universal. Segundo
FUTUYAMA (1992), esse é o ponto central dos ataques dos criacionistas à
evolução, e/ou o tema que pode oferecer pistas ao mistério que cerca o “modelo
perfeito dos animais” e a compreensão das possibilidades e limitações da
natureza humana.
O
homem é um produto da evolução, sendo assim, muitos dos problemas relacionados
a ele podem ser entendidos apenas quando o homem é considerado como um
organismo evoluído e em evolução. O conhecimento profundo dos princípios e
mecanismos da evolução é, portanto, um pré-requisito para entender o homem
(MAYR, 1977).
Dessa
forma, o trabalho aqui apresentado visa ser um primeiro passo para o conhecimento
dos princípios básicos que nortearam Charles Darwin no postulado da Teoria da
Evolução. O tema justifica-se pois a evolução, um dos conceitos e descobertas
fundamentais ao pensamento moderno, é ponto central para a Biologia
contemporânea e para o uso da Biologia na sociedade atual.
Sem a evolução, tanto a genética como a
fisiologia, perderiam a coerência; numerosas aplicações práticas da biologia
seriam puramente empíricas e teriam uma fundamentação teórica fraca, se é que
teriam alguma. De um ponto de vista filosófico, certamente nada pode trazer
mais satisfação do que conseguir um entendimento sobre nossa origem e a dos
outros seres vivos e podemos muito bem concordar com Darwin que ‘existe
grandeza nesta visão da vida’, na qual ‘de um começo tão simples, incontáveis
formas muito bonitas e maravilhosas, têm se desenvolvido e estão se
desenvolvendo’ (FUTUYAMA, 1992, p.563).
1.0 - CHARLES DARWIN – BREVE BIOGRAFIA
Charles Darwin, naturalista inglês, nasceu
em 12 de fevereiro de 1809, em Shrewsbury. Robert Darwin, seu pai, era Físico,
filho de Erasmus Darwin, poeta, filósofo e naturalista. A mãe de Charles,
Susannah Wedgood Darwin morreu quando ele contava apenas oito anos de idade.
Com dezesseis anos, Darwin deixou
Sherewsbury para estudar medicina na Universidade de Edinburgh. Repelido pelas
práticas cirúrgicas sem anestesia (ainda desconhecida na época), Darwin parte
para a Universidade de Cambridge, com o objetivo (imposto pelo seu pai) de
tornar-se clérigo da Igreja da Inglaterra.
A
vida religiosa não agrada a Darwin, e em 31 de dezembro de 1831 ele aceita o
convite para tornar-se membro de uma expedição científica a bordo do navio
Beagle. Assim, Darwin passa cinco anos (1831 a 1836) navegando pela costa do
Pacífico e pela América do sul. Durante este período, o Beagle aportou em quase
todos os continentes e ilhas maiores à medida que contornava o mundo, inclusive
no Brasil. Darwin fora chamado para exercer as funções de geólogo, botânico,
zoologista e homem de ciência. Esta viagem foi uma preparação fundamental para
a sua vida subseqüente de pesquisador e escritor. Tanto é verdade que na
introdução de seu livro ele assim se refere: "as relações geológicas que
existem entre a fauna extinta da América meridional, assim como certos fatos
relativos à distribuição dos seres organizados que povoam este continente,
impressionaram-me profundamente quando da minha viagem a bordo do Beagle, na
condição de naturalista. Estes fatos (...) parecem lançar alguma luz sobre a
origem das espécies (...) julguei que, acumulando pacientemente todos os dados
relativos a este assunto e examinando-os sob todos os aspectos, poderia,
talvez, elucidar esta questão" (p.17).
Em
todo o lugar onde ia, Darwin reunia grandes coleções de rochas, plantas e
animais (fósseis e vivos) enviadas à sua pátria. Imediatamente, após seu
regresso à Inglaterra, Darwin iniciou um caderno de notas sobre a evolução,
reunindo dados sobre a variação das espécies, dando assim os primeiros passos
para a Origem das Espécies. No começo, o grande enigma era explicar o
aparecimento e o desaparecimento das espécies. Assim surgiram, em sua cabeça,
várias questões: por que se originavam as espécies? Por que se modificavam com
o passar dos tempos, diferenciavam-se em numerosos tipos e freqüentemente
desapareciam do mundo por completo?
A
chave do mistério Darwin encontrou casualmente na leitura: "Ensaio sobre a
População", de Malthus.
Depois
disso, nasceu a famosa doutrina darwinista da seleção natural, da luta pela
sobrevivência ou da sobrevivência do mais apto - pedra fundamental da Origem
das Espécies.
As
pesquisas feitas pelo naturalista durante a viagem abordo do Beagle é que
fundamentaram sua Teoria da Evolução, servindo de base para o famoso livro
Origem das Espécies, cujo título original em Inglês é On The Origin of Species
By Means of Natural Selection ( Na Origem das Espécies – Sob o Conhecimento da
Seleção Natural). A obra foi publicada em 1859, sob o bombardeamento das
controvérsias – o que era(é) muito natural: Darwin estava(está) mudando a
crença contemporânea sobre a criação da vida na Terra. No livro Origem das
Espécies, Darwin defende duas teorias principais: a da evolução biológica -
todas as espécies de plantas e animais que vivem hoje descendem de formas mais
primitivas - e a de que esta evolução ocorre por "seleção natural".
Os princípios básicos da teoria sobre a evolução de Charles Darwin,
apresentados na Origem das Espécies, são quase que universalmente aceitos no
mundo científico; embora existam controvérsias em torno deles.
A
Origem das Espécies demonstra a atuação do princípio da seleção natural ao
impedir o aumento da população. Alguns indivíduos de uma espécie são mais
fortes, podem correr mais depressa, são mais inteligentes, mais imunes à
doença, mais agressivos sexualmente ou mais aptos a suportar os rigores do
clima do que seus companheiros. Estes sobreviverão e se reproduzirão, enquanto
os mais fracos perecerão. No curso de muitos milênios, as variações levaram à
criação de espécies essencialmente novas.
Após
a publicação de sua obra mais famosa, Darwin continua a escrever e publicar
trabalhos na área da Biologia por toda a sua vida. Ele passa a viver, com sua
esposa e filhos, em Downe, um vilarejo a 50 milhas de Londres. Sofre de
síndrome do pânico e mal-de-Chagas, o último adquirido durante sua viagem pela
América do Sul. A morte chega em 19 de abril de 1822. Charles Darwin é
sepultado na Abadia de Westminster.
2.0 - A TEORIA DA EVOLUÇÃO
A
noção de que os seres vivos do passado eram diferentes dos atuais e que eles
mudaram com o tempo ocorreu a muitos naturalistas dos séculos XVIII e XIX.
Muitos deles trabalharam no sentido de elaborar uma teoria coerente para
explicar a evolução. Mas foi Darwin quem acumulou uma quantidade tão grande de
evidências que tornou inevitável a aceitação da teoria evolucionista. Além
disso, sua obra é completamente original ao desenvolver novos conceitos, como
os de adaptação, luta pela vida e divergência de caracteres.
Entre
outros exemplos de ação da seleção artificial, Darwin toma o das raças inglesas
de aves de capoeira e conclui que descendem de uma espécie selvagem indica, o
Gallus bankiva. Do mesmo modo, mostra o cientista inglês que a multiplicação de
raças de pombos domésticos provém, por seleção artificial, do Pombo torcaz,
Columbia livia, compreendendo com este termo muitas espécies geográficas que só
diferem umas das outras em aspectos insignificantes.
Darwin
admite o fato de que "determinadas variações úteis ao homem são,
provavelmente, produzidas sucedânea e gradualmente por outras"(p.39). Cita
ele até certas variações, que nós chamamos hoje mutações, como o Cardo
Penteador, o Cão Tournebroche ou o Carneiro Ancon que "surgiram de maneira
súbita". Mas ele não se detém em tais tipos de variações bruscas de grande
amplitude. Efetivamente, Darwin mostra que a chave da origem de todas as raças
atuais se encontra no poder de seleção e de acumulação que o homem exerce nas
variações sucessivas fornecidas pela natureza. Considera ele que, desde os
tempos mais remotos, funcionou uma "seleção inconsciente", quando o
homem escolhia espontaneamente as plantas e os animais que lhe eram mais úteis,
durante um grande número de gerações sucessivas. Considerando as circunstâncias
favoráveis à seleção pelo homem, Darwin assinala a importância do número de
indivíduos que se criam, pois "como as variações manifestamente úteis ou
agradáveis ao homem se produzem apenas casualmente, tem-se tanto mais desejo em
produzi-las quanto maior é o número de indivíduos que se criam" (p.46). Se
substituíssemos variações pela palavra mutações, esta última asserção de Darwin
ainda seria válida hoje. Essa variabilidade - mal definida na ausência da
genética - pode-se substituir, sem dificuldades, por variações hereditárias do
patrimônio genético - mutações.
Darwin
considera temerário afirmar, como fazem alguns autores, que os animais
domésticos teriam atingido o limite da variação, isto é, que não são
suscetíveis de se transformar. A atualidade mostra que ele tinha razão.
Por
analogia com a seleção artificial, Darwin concebeu o que continua sendo o
núcleo válido de sua teoria, a seleção natural. Assim surgem algumas perguntas:
o princípio da seleção, que se apresenta tão poderoso entre as mãos do homem,
aplica-se ao estado selvagem? Quais podem ser as causas que resultam no
mecanismo da seleção natural? A essas questões, Darwin responde tomando como
ponto de partida a rapidez com que os seres organizados tendem a
multiplicar-se.
Darwin
chega à conclusão de que a luta pela existência leva, na natureza, à seleção
natural. Este combate pela vida é, segundo o evolucionista inglês, a
conseqüência necessária e "inevitável" do princípio do aumento
geométrico que rege o crescimento dos seres vivos e constitui a aplicação aos
reinos animal e vegetal da doutrina de Malthus. O princípio básico enunciado
por Malthus é que a população aumenta muito mais depressa que os alimentos. Diz
ele: "a população, quando não limitada, cresce numa proporção geométrica.
A subsistência aumenta apenas em proporção aritmética. Mesmo um conhecimento
superficial de matemática mostrará a imensa superioridade da primeira força com
relação à segunda. Nos reinos animal e vegetal, a natureza espalhou as sementes
da vida com profusão e liberalidade. Foi, porém mais econômica no espaço e no
alimento necessário para cultivá-las". A seqüência lógica do raciocínio de
Malthus é que deve haver obstáculos constantes ao crescimento da população. O
mais drástico de todos é a escassez de alimentos. Outros serão as atividades
insalubres, o trabalho excessivo, a pobreza extrema, as doenças, o mau
tratamento das crianças, as cidades grandes, as epidemias, a fome, os vícios,
aos quais Malthus acrescentou mais tarde a 'repressão moral’(in: DOWNS, R.B. p.145).
Logo
de início Darwin sublinha a dificuldade de ter sempre presente no espírito a
luta universal pela sobrevivência como um efeito de uma superpopulação em
relação à insuficiência dos meios de subsistência: "Contemplamos a
natureza exuberante de beleza e de prosperidade e notamos, muitas vezes, uma
superabundância de alimentação; mas não vemos, ou esquecemos, que as aves, que
cantam empoleiradas descuidosas num ramo, nutrem-se principalmente de insetos
ou de grãos, e que fazendo isto, destróem seguidamente seres vivos; esquecemos
que as aves carnívoras e os animais de presa estão à espreita para destruir
quantidades consideráveis destes alegres cantores, destruindo-lhes ovos ou
devorando-lhes os
filhos; não nos lembramos sempre de que,
se há superabundância de alimentação em certas épocas, o mesmo não se dá em
todas as estações do ano" (p.69).
O
autor de Origem das espécies mostra que até a espécie humana, cuja reprodução é
lenta, pode dobrar em vinte e cinco anos, e, consequentemente, "em menos
de mil anos, não haveria espaço suficiente no globo onde se conservasse de
pé"(p.70). O elefante - que, entre os animais mais conhecidos, é o que se
reproduz mais lentamente (reproduz-se dos 30 até os 90 anos) - chegaria,
segundo o cálculo de Darwin, depois de cerca de 750 anos, a 19 milhões de
indivíduos, partindo do primeiro casal. Evidentemente, nesses cálculos não são
contabilizados os obstáculos que se opõem à tendência natural para a
multiplicação.
"As
causas que se opõem à tendência natural para a multiplicação de cada espécie
são bastante obscuras"(p.72). Considerando que complexas e inesperadas são
as relações recíprocas dos seres organizados que lutam na mesma região Darwin
cita como principais barreiras à multiplicação: a quantidade de alimentos, o clima
e a facilidade com que os indivíduos se tornam presas de outros animais. Além
disso, característica de fundamental importância é a capacidade de reprodução.
Sabe-se
que Darwin constatou o papel essencial da seleção natural na evolução das
espécies. Neste sentido, ele questiona: quando vemos que variações úteis ao
homem ocorreram, incontestavelmente, seria tão improvável que outras variações
proveitosas, sob qualquer aspecto, para os seres organizados, em seu grande e
incessante combate pela vida, tenham às vezes
surgido no decorrer de milhares de gerações? Se semelhantes variações
são possíveis - importante lembrar que o número de indivíduos que nascem é
infinitamente maior do número dos que sobrevivem - deveríamos duvidar de que
aqueles que têm alguma vantagem, por pequena que seja, sobre outros, não tenham
mais chances de viver e propagar seu tipo? Por outro lado, qualquer variação
nociva, em qualquer grau, pode acarretar a extinção do indivíduo. É a essa
conservação de variações individuais favoráveis e à destruição das que são
nocivas que aplicou o conceito de seleção natural ou de persistência do mais
capaz.
Darwin
coloca que muitos escritores têm compreendido mal e criticado a expressão
seleção natural. Mas acredita que, depois de algum tempo, esses termos, a
princípio novos, tornar-se-ão familiares, e as críticas "inúteis"
serão esquecidas.
A
seleção natural é gerada na "luta pela sobrevivência", mas Darwin
logo adverte que emprega essa expressão no sentido metafórico mais amplo,
compreendendo as relações de dependência que existem entre um ser e outro e, o
que é mais importante, não apenas a vida do indivíduo, mas também a sua aptidão
e bom êxito no que se refere a descendentes. Destaca que dois animais
carnívoros, em tempos de fome, estão realmente em luta recíproca, para decidir
qual deles obterá o alimento que o fará sobreviver. Mas uma planta situada às
margens de um deserto luta pela vida contra a seca, ainda que fosse mais exato
dizer que sua existência depende de umidade.
Diante
disso, pode-se dizer que a luta pela existência, compreendida no sentido
metafórico do termo, produz relações muito imbricadas entre as diferentes
espécies na escala da natureza. Assim, Darwin constata que, na Inglaterra, a
presença de mamangabas é indispensável à fecundação do trevo vermelho, pois só
elas são capazes de perfurar a corola da flor, quando procuram o néctar. Mas o
número desses insetos varia em função do número de ratazanas que destróem seus
ninhos. Enfim, o número da população das ratazanas depende do número de gatos.
Assim, é perfeitamente possível, observa Darwin, que a abundância do elemento
felino em um local qualquer pode determinar através das ratazanas e das
mamangabas a freqüência de certas plantas. Essas relações ecológicas complexas
entre as espécies levam a uma seleção natural que, certamente, pode explicar as
"coadaptações" algumas vezes muito complicadas.
Ainda,
quanto à seleção natural, Darwin acredita que ela é responsável pela
divergência dos caracteres, partindo de um ancestral comum e também pela
extinção de certas cepas. A divergência dos caracteres é uma aquisição positiva
na luta pela existência: "um grupo de animais, cujos organismos apresentam
poucas diferenças, dificilmente pode lutar com um grupo cujas diferenças sejam
mais pronunciadas" (p.112). Assim, continua o pesquisador inglês, pode-se
duvidar, por exemplo, de que os marsupiais australianos, repartidos em grupos
pouco diferentes uns dos outros e que representam vagamente (...) nossos
mamíferos, carnívoros, ruminantes e roedores, pudessem um dia lutar com sucesso
contra essas ordens tão fortemente caracterizadas. Cita como exemplo que
"entre os mamíferos australianos podemos observar a diferença das espécies
num estado incompleto de desenvolvimento" (p.112).
Segundo
Darwin, a ação da seleção natural pode explicar o processo de progresso
gradual: "A seleção natural atua exclusivamente no meio da conservação e
acumulação das variações que são úteis a cada indivíduo nas condições orgânicas
em que pode encontrar-se situado em todos os períodos da vida. Cada ser, e é
este o ponto final do progresso, tende a aprimorar-se cada vez mais em relação
a estas condições. Este aperfeiçoamento conduz inevitavelmente ao progresso
gradual da organização de maior número de seres vivos em todo o mundo"
(p.119). No entanto, Darwin reconhece a dificuldade que se tem ao definir o
progresso da organização: "referimo-nos aqui a um assunto muito complexo,
porque os naturalistas ainda não definiram, de forma satisfatória para todos, o
que deve compreender por um 'progresso de organização' " (p.119). Para os
vertebrados, trata-se, evidentemente, de um progresso intelectual e de uma
conformação que se aproxime da do homem."
Darwin
está perfeitamente consciente do papel do fator tempo na ação da seleção natural,
cuja eficácia é enfatizada pelo grande naturalista: "por mais lenta que
seja a marcha da seleção, já que o homem pode, com seus fracos meios, fazer
muito por seleção artificial, não vejo nenhum limite para a extensão das
mudanças, para a beleza e para a infinita complicação das coadaptações entre
todos os seres organizados, tanto uns com os outros, quanto com as condições
físicas nas quais eles se encontram, mudanças que podem, no decorrer do tempo,
ser efetuadas pela seleção natural, ou a sobrevivência dos mais aptos." O
papel predominante da seleção natural na concepção de Darwin é, por ele mesmo,
posto em evidência.
Darwin
evidencia o combate no interior de uma espécie e entre as diferentes espécies
biológicas - intra e interespecífico -, em um habitat comum, como a base
biológica de seleção natural. Assinala também que a luta pela existência é mais
severa entre os indivíduos e as variedades da mesma espécie. Diz ele que a luta
é muito mais intensa entre os indivíduos pertencentes à mesma espécie, os quais
com efeito, freqüentam as mesmas regiões, procuram o mesmo alimento, e vêem-se
expostos aos mesmos perigos. Darwin exemplifica dizendo que se semearmos juntas
diversas variedades de trigo, e se mais tarde semearmos novamente os seus grãos
misturados, as variedades às quais o solo e o clima serão mais convenientes, ou
que são por natureza mais férteis prevalecerão contra as outras, fornecendo
assim mais grãos, não tardando em suplantá-las completamente. Para conseguir
conservar uma coleção de variedades muito vizinhas, como por exemplo, da
ervilha-de-cheiro, é preciso, a cada ano, colhê-las separadamente, depois
misturar suas sementes nas proporções desejadas. Pois, de outro modo, as
variedades mais fracas diminuem e acabam por extinguir-se. Para provar que a
concorrência recíproca será muito mais rigorosa entre as espécies de um mesmo
gênero que entre as espécies de gêneros diferentes, Darwin cita, entre muitos
exemplos, que nos Estados Unidos uma espécie de andorinha causou a extinção de
uma outra congênere.
Esse
combate intra-específico, na concepção de Darwin, não leva, de modo algum, à
destruição da espécie, mas, ao contrário, leva um grupo formado pelos
indivíduos mais aptos a sobreviver, conseqüentemente mais bem adaptados às suas
condições de existência. No que se refere ao combate inter-específico, pode ele
conduzir à eliminação de certas espécies ou variedades por outras mais bem
armadas, mas em muitos casos, esse tipo de luta pela existência pode produzir
um reforço recíproco das espécies em concorrência, pela sobrevivência dos
indivíduos mais resistentes.
Além
disso, a luta pela existência - inter ou intra-específica - explica as
coadaptações muito diversas que existem na natureza: "a conformação de
cada ser organizado está em relação, nos pontos mais importantes e algumas
vezes mais ocultos, com a de todos os seres organizados com os quais se acha em
concorrência para a sua alimentação e habitação, e com a de todos aqueles que
lhe servem de presa ou contra os quais tem de defender-se"(p.79/80). Essa
asserção é ilustrada pela conformação das garras e das presas do tigre e a das
patas e dentes do parasita que se agarra aos pêlos de seu corpo. Não se
limitando ao mundo animal, tais adaptações específicas se encontram também no
reino vegetal. Assim, as sementes providas de um feixe de pêlos podem ser
transportadas a distância e cair num terreno não ocupado por outras espécies;
até a reserva de alimento que se acumula nas sementes de vegetais favorece
espécies muito ricas em tais acúmulos, como por exemplo, as ervilhas e as favas
quando se encontram disseminadas entre as plantas selvagens. Darwin observa
ainda: "A substância nutritiva depositada nas sementes de muitas destas
plantas parece, de início, não apresentar espécie alguma de conexão com outras
plantas. Contudo, o crescimento vigoroso das novas plantas provindo destas
sementes (...) parece indicar que a principal vantagem desta substância é
favorecer o crescimento da sementeira na luta que sustenta com as outras
plantas que crescem em volta de si" (p.80).
Recapitulando
sua concepção da luta pela existência, Darwin conclui com otimismo que devemos
"lembrar-nos a todo instante que os seres organizados se empenham
incessantemente por se multiplicar seguindo uma progressão geométrica; cada indivíduo,
em algumas fases da vida, durante determinadas estações do ano, no decurso de
cada geração ou em certos intervalos, deve lutar pela sobrevivência e
permanecer exposto à destruição. O simples fato de pensar nesta luta universal
provoca tristes reflexões; todavia, podemos consolar-nos com a certeza de que a
luta não é incessante na natureza, que o medo é desconhecido, que a morte está
geralmente pronta, e que os seres vigorosos, sadios e afortunados sobreviverão
e se multiplicarão" (p.81).
Outro
tipo de seleção que Darwin evidencia é a chamada seleção sexual. Esta, é ainda
considerada com reserva no mundo científico. Sabe-se que não se trata de uma
luta pela existência, no sentido estrito da palavra, mas de um combate pelo
prolongamento da existência individual na descendência. O pesquisador assim
coloca: esta espécie de seleção não depende da luta pela sobrevivência com
outros seres organizados, ou com as condições ambiente, mas a luta entre os
indivíduos de um mesmo sexo, ordinariamente machos, para assegurar a posse do
sexo oposto. Esta luta não cessa com a morte do vencido, mas pela falta ou pela
pequena quantidade de descendentes"(p.90/91). Acrescenta ainda: "A
seleção sexual, é pois, menos rigorosa que a seleção natural" (p.91).
Sabe-se
que os machos diferem das fêmeas de sua espécie pelos caracteres sexuais
primários - órgãos de reprodução -, mas também por caracteres sexuais
secundários como por exemplo, a cauda do pavão. É a seleção sexual a
responsável, segundo Darwin, por esses atributos que servem para combater e
repelir os rivais, impedindo-os assim de fecundar as fêmeas, enquanto os
ornamentos, as cores, os odores, etc., têm a função de atraí-las. O pesquisador
inglês considera que se deve atribuir tais caracteres à ação à seleção sexual e
não à seleção ordinária, pois os machos desprovidos de tais atributos
secundários poderiam afrontar a luta pela existência e engendrar uma numerosa
descendência, se não encontrassem machos mais bem dotados em armas ou em
atrativos; a prova disso é que as fêmeas que não possuem tais meios
suplementares podem muito bem sobreviver e reproduzir a espécie. Darwin
estabelece uma analogia entre a seleção sexual e a artificial: da mesma maneira
que o brutal criador de galos de briga pode aprimorar a raça pela escolha
rigorosa dos seus mais belos exemplares, assim também os machos mais vigorosos,
isto é, os que são mais capazes a ocupar o seu lugar na natureza, deixam um
número maior de descendentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como
disse Darwin, no mundo inteiro, a seleção natural procura, a cada dia, a cada
hora, as mais leves variações; rejeita as que não servem, preservando e
acrescentando as que servem. É desta forma que a teoria da evolução contínua é
apresentada na Origem das Espécies.
A
específica contribuição que Darwin trouxe às investigações evolucionistas é o
princípio da seleção natural. A evolução progride em perfeição cada vez maior,
porque os organismos são selecionados. Quem faz essa seleção é a própria
natureza; seleção muito mais profunda que a seleção artificial. Para explicar a
modalidade em que essa seleção acontece, Darwin se reporta a Thomas Malthus,
cujas teorias em torno do crescimento populacional preconizavam, no futuro, uma
luta pela sobrevivência. Para o pesquisador, a luta pela vida, oriunda da falta
de alimentos e condições de vida adversas, sempre existiu, e nesta luta
sobreviveram sempre os organismos mais fortes, mais rijos, ocasionando uma
seleção constante. Tal seleção é auxiliada por uma seleção sexual, pois os
acasalamentos se dão entre espécimes mais fortes; pelas mudanças ambientais,
pois estas sempre acontecem em benefício das espécies; pela hereditariedade,
pois os filhos recebem, na geração, os caracteres dos pais.
Pode-se
dizer que a influência de Darwin em quase todos os ramos importantes do
conhecimento foi e continua a ser profunda.
Basicamente,
Darwin apresentou um mecanismo aceitável para explicar como as espécies se
modificam. Ele documentou que os organismos se modificam contínua, lenta e
gradualmente, de modo a, sem saltos, originar novos tipos de seres vivos ao
longo de uma série de etapas intermediárias de seres em transformação; admitiu
que estas mudanças permitem aos organismos adaptarem-se ao meio onde vivem e
que elas são promovidas pela seleção natural - um mecanismo que favorece
determinados indivíduos a deixar mais descendentes do que outros.
Cabe
ressaltar que também em relação à evolução, Darwin foi pioneiro ao transpor a
análise individual dos organismos - feita pela biologia clássica - para os
estudos modernos que envolvem populações inteiras de plantas e animais.
Para
sintetizar, Darwin é, com toda justiça, considerado um dos mais criteriosos e
competentes observadores da natureza. Demonstrou que a adaptação ao ambiente
decorre da ação da seleção natural e foi o seguidor e cloncluinte de uma teoria
científica que, antes dele, vinha germinando ou que, pelo menos, já tinha sido
prognosticada filosoficamente.
Alguns
evolucionistas pós-darwinianos tenderam a propagar uma idéia empobrecida,
ingenuamente feroz, da seleção natural, a idéia da pura e simples "luta
pela vida", expressão que inclusive não é de Darwin, mas de Spencer. Os
neodarwinianos do começo deste século propuseram, ao contrário, uma concepção
muito mais rica, importante e mostraram, baseados em teorias quantitativas, que
o fator decisivo da seleção não é a "luta pela vida", mas no interior
de uma espécie, a taxa diferencial de reprodução.
Para
finalizar, Darwin não nega que alguns se opõem à teoria da descendência -
modificada pela variação e pela seleção natural - com numerosas e sérias
contestações. Porém, o pesquisador considera a objeção levantada por sir
William Thompson como uma das mais sérias. Dizia ele que o intervalo decorrido
desde o surgimento da Terra teria sido insuficiente para permitir a soma das
alterações orgânicas que se admite. Darwin responde a isso dizendo, em primeiro
lugar, que não há como precisar (avaliada em anos) a rapidez das modificações
das espécies e, depois, que muitos cientistas até admitem o insuficiente
conhecimento da constituição do universo e do interior do Planeta para saber de
forma precisa sua idade.
Darwin
acrescenta ainda que se forem considerados períodos longos, a geologia prova
que todas as espécies se transformaram e se transformam de acordo com sua
teoria - lenta e progressivamente.
Interessante
colocar que Darwin, quanto às objeções mais sérias, julga-se ignorante para
avaliá-las. No entanto, elas não são suficientes para contestar os fatos e
considerações que profundamente o convenceram de que, durante uma longa série
de gerações, as espécies se modificaram. Acrescenta ainda, que essas
modificações efetuaram-se principalmente pela seleção natural de numerosas
variações pequenas, mas vantajosas.
Com
relação à afirmação de que o pesquisador atribui as modificações da espécies
exclusivamente à seleção natural, Darwin assim defende-se dizendo que sempre
deixou clara sua posição, escrevendo no final da introdução da primeira edição
dessa obra o seguinte: "Estou convencido de que a seleção natural tem sido
o agente principal das modificações, mas jamais o foi exclusivamente
só"(p.450).
Além
disso, contestaram a teoria da seleção natural criticando o método de
raciocínio. Darwin responde dizendo: "os maiores sábios não deixaram de o
seguir" (p.451).
Conclui-se
o presente trabalho com a correta colocação de Darwin: "Quando as opiniões
que expus nesta obra, opiniões que Mr. Wallace afirmou também do jornal da
Sociedade Lineana, e quando opiniões semelhantes sobre a origem das espécies
forem geralmente aceitas pelos naturalistas, podemos prever que se produzirá na
história natural uma importante revolução”.
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Lucy Magalhães. Jorge Zahar Editor. Coleção Cultura Contemporânea. Rio de
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Maria Alice Gelman. Geração Editorial. São Paulo. 1995.
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MONOD, J. O Acaso e a Necessidade.
Tradução: Bruno Palma e Pedro P. de S. Madureira. Ed. Vozes. Petrópolis-RJ,
1972.
Autores:
Paulo Ricardo da Silva, Rafael Régis
Zamboni e Ana Flávia Marques
Enviado por Laboratório de Biotecnologia
Vegetal – email
BIBLIOTECA VIRTUAL
http://www.bibliotecavirtual.com.br
Sua fonte de pesquisas na Internet